Embora não seja uma situação comum (bem pelo contrário), é possível que um dia acordemos e encontremos o que, à priori, poderia ser uma boa surpresa: alguém nos transferiu dinheiro para a nossa conta corrente. No entanto, não é provável que seja uma prenda antecipada de Natal. O mais certo é alguém ter cometido um erro ao fazer uma transferência e o dinheiro acabou por entrar na nossa conta bancária.
Mas o que devemos fazer numa situação deste tipo? Não. Não nos devemos fazer de “esquecidos” e manter o dinheiro na conta como se não se tivesse passado nada. O mais correcto e ético é ir ao banco e devolver o dinheiro. Mas quer saber o que pode acontecer se não devolver o dinheiro?
Todas as transferências estão devidamente identificadas
Receber uma transferência na nossa conta bancária por engano é muito diferente de encontrar uma nota de 50 euros na rua. Todas as transferências estão identificadas electronicamente, com os códigos IBAN e BIC correspondentes, bem como o emissor e o beneficiário do dinheiro e o valor, entre outros dados.
Por esta razão, seguir o rasto do dinheiro é uma tarefa muito simples. Para além disso, e desde que foi implementada a Zona Única de Pagamentos em Euros (SEPA) em toda a União Europeia, os critérios para emitir transferências em toda a região foram estandardizados, o que na prática significa que o sistema é mais seguro.
Em consequência, o mais provável é que alguém reclame que a transferência foi incorrecta e que se saiba para onde o dinheiro foi transferido. Mas, que consequências podemos ter se o dinheiro for reclamado?
Recentemente aconteceu uma situação destas com o Novo Banco que transferiu milhares de euros por engano para ex-clientes, conforme foi largamente noticiado na altura, não se sabendo o número de clientes ou os montantes envolvidos.
O Banco de Portugal refere que o procedimento de “pedido de devolução” pode ser iniciado pelo banco do ordenante depois da execução de uma transferência a crédito.
Tal situação pode ocorrer tanto por iniciativa do banco (quando, por exemplo, a transferência a que respeita o pedido de devolução se tenha realizado devido a um problema técnico, como por iniciativa do cliente (o ordenante da operação), nos casos em que este, por exemplo, inadvertidamente duplica a ordem de transferência.
Uma vez recebido um pedido de devolução, o banco do beneficiário terá de confirmar ou rejeitar a devolução dos fundos ao banco do ordenante, refere o Banco de Portugal.
“Nas situações em que a conta do cliente beneficiário tenha já sido creditada com os fundos, o banco do beneficiário apenas pode debitar a conta do cliente com autorização deste”, sublinha.
Se o cliente beneficiário recusar a devolução de fundos indevidamente creditados na sua conta, o ordenante não conseguirá recuperar os fundos através do sistema bancário, tendo de recorrer aos tribunais para reaver o dinheiro.
Segundo dados do Banco de Portugal, os “Pedidos de Devolução” processados no Sistemas de Compensação Interbancária (SICOI) entre Dezembro de 2015 e Fevereiro de 2016, corresponderam, em média, a apenas 0,009% das transferências ordenadas.
Este procedimento está definido no “standard” europeu para as transferências SEPA, conhecido por Rulebook (publicado pelo European Payments Council), que tem definido um conjunto de mecanismos que permitem ao banco do ordenante enviar ao banco do beneficiário da transferência, dentro do prazo estabelecido, “Pedidos de Devolução” de transferências que tenha efectuado.
Mais recentemente, um dos funcionários do maior banco alemão transferiu por engano mais de 5.000 milhões de euros para um fundo de investimento norte-americano. No entanto, neste caso o receptor percebeu que se tinha tratado de um erro e devolveu imediatamente o dinheiro ao emissor.
Assim e se nos depararmos com uma situação deste género, não devemos sentir-nos uns felizardos. Devemos é evitar problemas maiores, porque embora o banco apenas possa devolver o dinheiro com nossa autorização, a verdade é que o ordenante da transferência pode recorrer aos tribunais para reaver o dinheiro. E neste caso, iremos ter problemas e despesas que poderiam ser evitados caso tivéssemos devolvido imediatamente o dinheiro que não nos pertencia.