A discussão entre as vantagens e desvantagens associadas à compra e ao arrendamento de casas tem sido uma discussão permanente. Os nossos leitores têm-nos perguntado qual a alternativa que consideramos mais interessante, sendo uma pergunta cada vez mais frequente quando se pensa que o custo do dinheiro em Portugal está baixo (será?).
Do estudo que fazemos a esta questão constatamos que não existe um consenso claro quanto à melhor alternativa sendo certo que cada caso é um caso e que para tomar a melhor decisão deverá fazer algumas contasAntes de mais, importa deixar a nota que não sou um especialista no mercado imobiliário. Tenho uma habitação própria comprada e tenho uma segunda casa comprada para arrendamento, ambas com financiamento bancário. Feita esta nota, irei procurar abordar as vantagens e desvantagens de cada uma das modalidades e fazer uma análise financeira da decisão. Resta reforçar que a compra de casa para habitação não deve ser vista como um investimento mas antes pela utilidade que lhe está associada.
Indice
Vale a pensa comprar casa?
A generalidade das pessoas que me fala da lógica de compra de habitação defende esta alternativa por três motivos:
- Estamos a pagar um activo que acaba por ficar para nós, mesmo que apenas ao final de vários (muitos) anos;
- A prestação ao banco é, muitas vezes, bastante inferior ao valor da renda paga a um senhorio;
- A casa vai acabar por valorizar e o seu dono acaba por ganhar com essa valorização (discutível, ainda para mais olhando para a quantidade de casas por vender e o impacto da demografia na procura de casas a prazo);
É um facto que a compra de uma casa resulta na posse futura desse activo. Contudo, a compra de uma casa tem um custo de oportunidade que importa medir. Na prática, ao colocar o dinheiro na sua casa não irá poder coloca-lo em investimentos alternativos que acabaram por gerar rendimentos. Resta perguntar: é interessante ser dono, mas a que preço?
Também é um facto que a prestação ao banco acaba muitas vezes por ser inferior ao valor da renda que pagamos a um senhorio. No entanto, como veremos de seguida, o custo de uma casa inclui muitos outros custos como os impostos, as obras de melhoria, os seguros, o condomínio, entre outros. Estes outros custos são demasiado relevantes para serem ignorados.
Não será um facto a valorização certa dos bens imóveis. Se é verdade que durante muitos anos as casas beneficiaram de uma valorização apreciável nos dias que correm já não será válido. Aliás, a valorização dos imóveis depende de inúmeros fatores entre os quais a oferta/procura e a demografia, a geografia, a qualidade dos acabamentos. Muitas das casas compradas no início da década, especialmente em algumas áreas geográficas, perderam bastante valor.
Finalmente, uma nota para a ideia de que o dinheiro não está assim tão barato. Se tem um contrato de crédito habitação antigo, estará certamente a beneficiar de óptimas condições de financiamento. No entanto, se pretende entrar num novo contrato de crédito saiba que o seu spread (que tem impacto final na taxa de juro suportada) irá ser na ordem dos 1.5%-4%. E o que acontece quando a EURIBOR começar a subir?
Custos e desvantagens da compra de casa:
Apesar de existirem vantagens na compra de casa para habitação própria (não referi anteriormente mas termos uma casa no nosso género, com a nossa decoração e disposição e vê-la a crescer com a família também é positivo, apesar de não ter valor) é de notar a existência de custos e outras desvantagens associados à compra de casa:
- Carga fiscal – O simples ato de compra de casa acarreta logo à partida um custo que representa entre 6% a 10% do valor do imóvel. Ou seja, numa casa de €100.000 terá um custo entre escritura, IMT e afins de €6.000 (dinheiro que poderia estar investido a render juros). A acrescer a este valor temos ainda o IMI e outras taxas municipais que também pesam no seu orçamento;
- Burocracia – A compra e manutenção de casa tem associada uma carga burocrática expressiva;
- Custos de manutenção – A compra de uma casa implica a sua manutenção ao longo dos anos. Pinturas, canos rotos, obras no condomínio, infiltrações, entre outros. Todas estas obras são a cargo do dono da casa;
Seguros – Ao comprar uma casa tem de suportar um seguro de vida (cujo prémio aumenta com a sua idade) e um seguro multirriscos. - Fraca mobilidade – A compra de casa tem associado um compromisso de médio/longo prazo. Na prática, se compra uma casa tenderá a ficar “preso” a essa casa. Em situação de desemprego, de mudança geográfica de emprego, crescimento da família, má vizinhança, etc, não poderá mudar com facilidade.
Como analisar o valor da sua renda:
Caso viva numa casa arrendada, sugerimos que olhe para a sua renda em função do valor de mercado da casa. Deste modo, irá conseguir olhar objetivamente para o valor da renda. Imagine o seguinte caso:
- Valor de mercado da casa – €150.000;
- Valor da renda – €600/mês, que implica €7.200 por ano;
- Estimativa de custo anual – €1.500
Assumindo esta situação, saiba que o retorno anual do seu senhorio é de 3.8% [(7.200-1500)/150.000]. O que concluir? Conclui que o valor da renda é razoável. Já se morar numa casa de €100.000 o valor do retorno é de 5.7% pelo que haverá algum espaço para negociar.
Como avaliar financeiramente a decisão de compra?
Ao olhar para a decisão de compra deverá olhar para o valor da utilidade de viver na casa. Na prática, se viveu 3 anos numa casa e se a vendeu pelo mesmo valor do que o valor de compra, terá ganhado ou perdido dinheiro?
Um pequeno exemplo, retirado do meu “Manual das Finanças Pessoais” pode ajudar a clarificar esta situação:
Imagine que compra uma casa por 250 000 € e que, em despesas iniciais e outros custos, paga aproximadamente 10% do valor inicial de compra. Imagine igualmente que vende a casa, dentro de cinco anos, por 300 000 €. Deste modo, conseguirá um lucro de 25 000 €, o que dá, assumindo uma taxa de imposto de 30%, um lucro líquido de impostos de 17 500 €. Fazendo umas contas rápidas, ficamos a saber que a taxa de retorno total é de 7% e que o retorno anual será perto de 1,4%.
Não é preciso ser um génio para perceber que esta taxa de retorno é muito baixa e que, na maioria dos anos, nem chega para suprir a subida do nível geral de preços. Claramente que este seria um péssimo investimento.
Mas seremos razoáveis ao assumir apenas aqueles valores? Não deveremos considerar, igualmente, a utilidade que obtemos por viver na nossa casa?
E como devemos avaliar essa utilidade? Um dos principais motivos da compra de uma casa é nela habitar. Ao fazê -lo, evitamos pagar um arrendamento de uma casa ao seu proprietário. Assim, a melhor forma de avaliar a utilidade da compra de casa será pelo valor da renda que deixamos de pagar. Neste caso, assumimos que o valor do arrendamento mensal de uma casa com as mesmas características seria de 900 €. Assim, incorreríamos num custo anual de 10 800 €, o que perfaria um valor em cinco anos de 54 000 €. Este é o valor que atribuiríamos à utilização da casa, para efeitos de habitação.
O que concluir? Não existe uma alternativa melhor do que a outra em todas as situações. Temos de fazer contas e analisar cada situação específica. Nos dias que correm e assumindo a tentação do Sheriff de Nottingham de vir colher os seus impostos em bens imóveis, valerá a pena prender o dinheiro no imobiliário?